segunda-feira, 21 de março de 2011

PROVA OBTIDA POR MEIOS ILÍCITOS - A INADMISSIBILIDADE DE SEU USO NO PROCESSO

“Discute-se, com polêmicos argumentos, e em razão da regra prevista no inciso LVI do art. 5° da CF, acerca da possibilidade de transferir – a título de prova emprestada –, conteúdo de interceptação

telefônica obtida em processo no qual o
imputado não fora parte.

Indaga-se, então, se a interceptação telefônica, mesmo manejada à luz da Lei nº 9.296/96, que regulamentou o inciso XII, parte final, do art. 5°, da CF, obtida em autos de processo-crime onde o imputado não fora parte, pode ser utilizada contra este, como prova emprestada, e ainda que não guarde nenhum elemento de conexão com o anterior processo.”

CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
O comando – de dignidade constitucional – que inadmite o uso no processo da prova obtida por meios ilícitos (art. 5°, inc. LVI, CF), a bem dizer, tem merecido inúmeros e fecundos estudos, como atestam os valorosos trabalhos doutrinários de José Carlos Barbosa Moreira, O Processo Penal Norte-americano e sua Influência, Revista Jurídica Consulex, ano VI, nº 148, 15.3.03; Luiz Flávio Gomes, Interceptação Telefônica, RT, SP, 1997; e Ricardo Raboneze, Síntese, RS, 4. ed.
Da mesma forma, o tema foi amplamente debatido quando do julgamento no Supremo Tribunal Federal, da AP
nº 307-3/DF, Pleno, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 13.10.95.
Corolário do devido processo legal (art. 5°, inc. LIV, CF), registra a Carta Política como garantia dos direitos fundamentais que são inadmissíveis no processo as provas obtidas por meios ilícitos (art. 5°, inc. LVI, CF).
E protegendo a intimidade, estabeleceu que é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal (grifei) (art. 5°, inc. XII, CF).
Por sua vez, a Lei nº 9.296/96, regulamentadora do dispositivo constitucional, assentou no parágrafo único do art. 2°, que em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada (grifei).
Da leitura de tais dispositivos, resulta claro que a interceptação telefônica de pessoa não indicada e qualificada na prévia investigação constitui-se, a mais não poder, na quebra de um direito fundamental, com manifesta violação da privacidade, e que justifica a impetração do mandamus (art. 5°, inc. LXIX, CF).
E não cabe apontar como excludente a ressalva da lei que cuidou da impossibilidade manifesta da qualificação do investigado, visto que tal circunstância, como é correntio, deve ser devidamente justificada, e em casos excepcionais, quando não se conhece a identidade física do investigado.
A matéria, ressalte-se, de conteúdo relevante, vem ademais provocando dissidências diante dos sucessivos acontecimentos relacionados com o que a doutrina rotulou de encontro fortuito de outros fatos ou de outros envolvidos, e mormente quando se cogita da intitulada prova emprestada, particularmente se obtida através de interceptação telefônica no rasto do que preceitua o art. 5°, inc. XII, da Carta Política, dispositivo regulamentado pela Lei nº 9.296/96.
A demanda ganha maior relevo na hipótese de ocorrência, mesmo no curso de regular procedimento de interceptação telefônica (art. 2°, parágrafo único, Lei nº 9.296/96), do que a doutrina, repita-se, classifica de “encontro fortuito de outros fatos ou de outros envolvidos”, tema abordado pelo Prof. Luiz Flávio Gomes em sua obra Interceptação Telefônica, RT, SP.
Merece anotar, por oportuno, que a possibilidade da utilização da interceptação telefônica, para fins de investigação criminal, prevista no inciso XII, in fine, do artigo 5°, da Carta Política, provocou, como é cediço, antes da edição da Lei nº 9.296/96, fundadas divergências no campo da doutrina e da jurisprudência, e diante de inúmeros casos concretos, onde se discutiu ser ou não auto-aplicável a norma constitucional, ou então acerca da necessidade da norma regulamentadora, na impossibilidade da aplicação de teoria da recepção, tudo para legitimar a interceptação telefônica, eventualmente obtida à luz do Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei
nº 4.117/62 – art. 57).
Na ocasião, a questão foi afinal dilucidada pela colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o HC
nº 74.586-5, maioria, Relator o Ministro Marco Aurélio (DJ 27.4.01), restando então firmado que: “não é auto-aplicável o inciso XII do artigo 5° da Constituição Federal, exsurge ilícita a prova produzida em período anterior à regulamentação do dispositivo constitucional” (Cf. Luiz Flávio Gomes, obra citada, p. 82).
Nesse contexto, e após o advento da Lei nº 9.296/96, e com o surgimento do intitulado “encontro fortuito de outros fatos ou de outros envolvidos”, tem-se pretendido apontar como solução para o desate, o uso da nominada prova emprestada, solução que, todavia, tem enfrentado obstáculos na hipótese de ter sido produzida com inobservância do contraditório e do princípio do juiz natural (STF, HC nº 78749-MS, DJ 25.6.99; STF, HC nº 67.707-RS, DJ 14.8.92; STJ, HC nº 14274-PR, DJ 4.6.01; TRF, 1ª R, Ac. nº 95.01.36237-0-MG, DJ 1º.7.98; TJDF, APR 2000.01.3.0013755, DJ 6.6.01).
Com efeito, a matéria é bastante ampla em seus desdobramentos, portanto, não se pretende, como é óbvio, o esgotamento do tema.
Dito isto, passemos ao sintetizado estudo.
A REGRA DO SIGILO DAS COMUNICAÇÕES TELEFÔNICAS E A RESPECTIVA RESSALVA (ART. 5º, INC. XII, DA CF, E A LEI Nº 9.296/96)
De fato, a regra da inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas sofre abrandamento nas hipóteses elencadas na lei posto que as garantias fundamentais do homem, como apontam doutrina e jurisprudência, não podem servir de apanágio à desordem, ao caos, à subversão da ordem pública (Uadi Lammêgo Bulos, Constituição Federal Anotada, Saraiva, SP, 2000,
p. 115; STJ, HC nº 3.982-RJ, Rel. Min. Adhemar Maciel, DJ 26.2.96).
A interceptação telefônica já mereceu inúmeras considerações doutrinárias, merecendo destaque as anotações de Uadi Lammêgo Bulos, ao ensejo do art. 5°, inc. XII, da Carta política:
“f) Quando a gravação telefônica é lícita ou ilícita.
Com base no dispositivo constitucional em estudo, podemos enumerar sete passos que ajudarão a saber se a gravação telefônica é lícita ou ilícita.
1°) não constitui delito a gravação feita por uma das pessoas que estiver conversando ao telefone, como outro interlocutor, para obter a prova de um crime. Nesse caso, não se exige autorização judicial;
2°) mas, se um terceiro gravar ou interceptar uma conversa entre duas outras pessoas, cometerá crime, ainda que seja de um parente, de um amigo, de um companheiro bem próximo ou de um familiar íntimo. Trata-se de ato ilícito, que pode sujeitar o seu autor a uma pena de reclusão de dois a quatro anos;
3°) durante a investigação de um crime, a autoridade policial poderá gravar conversas telefônicas entre duas ou mais pessoas, desde que esteja munida de ordem do juiz;
4°) todavia, se a polícia, ao realizar o trabalho de investigação do delito, gravar conversas telefônicas sem ordem judicial, cometerá ato ilícito;
5°) pessoas jurídicas, v.g., empresas, escritórios comerciais, etc., podem gravar os telefonemas de seus funcionários, desde quando eles sejam devidamente comunicados desse procedimento;
6°) a gravação telefônica de conversas ou diálogos sobre assuntos gerais por um dos interlocutores não é crime;
7°) porém, se um dos interlocutores ao gravar a conversa telefônica, invadir a esfera pessoal do outro estará agredindo a intimidade alheia, considerada inviolável pela Constituição. Nesse caso, cumprirá ao magistrado, se devidamente provocado, decidir acerca do direito à indenização pelo dano material ou moral (art. 5°, X).” (Constituição Federal Anotada, Saraiva, SP, 2000, p. 120)

A QUESTÃO DO “ENCONTRO FORTUITO” DE OUTROS FATOS OU DE OUTROS ENVOLVIDOS
Discute-se, com polêmicos argumentos, e em razão da regra prevista no inciso LVI do art. 5° da CF, acerca da possibilidade de transferir – a título de prova emprestada –, conteúdo de interceptação telefônica obtida em processo no qual o imputado não fora parte.
Indaga-se, então, se a interceptação telefônica, mesmo manejada à luz da Lei
nº 9.296/96, que regulamentou o inciso XII, parte final, do art. 5°, da CF, obtida em autos de processo crime onde o imputado não fora parte, pode ser utilizada contra este, como prova emprestada, e ainda que não guarde nenhum elemento de conexão com o anterior processo.
Bastante pertinente, o trabalho doutrinário de Luiz Flávio Gomes, ao comentar o art. 2° e seu parágrafo único da Lei n° 9.296/96 (Interceptação Telefônica), quando tratou da questão do “encontro fortuito” de outros fatos ou de outros envolvidos:
“Da decisão judicial que determina a interceptação telefônica sobressaem, dentre outros, dois requisitos, ambos previstos no art. 2°, parágrafo único, da Lei
nº 9.296/96: a) descrição com clareza da situação objeto da investigação; b) indicação e qualificação dos investigados (dos sujeitos passivos). Fala-se em parte objetiva (fática) e subjetiva da medida cautelar. A lei, com inteira razão, preocupou-se com a correta individualização do fato objeto da persecução, assim como com a pessoa a ser investigada. Mas no curso da captação da comunicação telefônica ou telemática podem surgir outros fatos penalmente relevantes, distintos da “situação objeto da investigação”. Esses fatos podem envolver o investigado ou outras pessoas. De outro lado, podem aparecer outros envolvidos, com o mesmo fato investigado ou com outros fatos, diferentes do que motivou a decretação da interceptação. Estamos diante do que a doutrina denomina de “encontro fortuito” (hallazgos fortuitos) ou “descubrimientos casuales” ou “descubrimientos acidentales” ou, como se diz na Alemanha, Zufallsfunden. Damásio E. de Jesus ainda menciona: conhecimento fortuito de outro crime, novação do objeto da interceptação ou resultado diverso do pretendido” (grifei).
(Interceptação Telefônica, RT, SP, 1997, p. 192.)
O citado autor apontou a doutrina, inclusive estrangeira: Tomás López Fragoso, Revista do Instituto Batolomé de las Casas, ano I, out./93 a mar./94, nº 2, Universidade Carlos III, Madri, p. 82; Damásio E. de Jesus, in Interceptação de Comunicações Telefônicas, RT 735/458; Antônio Pablo Rives Seva, in Revista Actualidad Penal, La Ley-Actualidad, Madri, 32/4, setembro de 1995, p. 557.
A questão central no “encontro fortuito”, segundo Luiz Flávio Gomes, versa sobre a validade da prova, “é dizer, o meio probatório conquistado com a interceptação telefônica vale também para os fatos ou pessoas encontradas fortuitamente”?
Respondendo a indagação, anota o autor:
“Na doutrina nacional, neste assunto, já se entrevê divergência: Damásio E. de Jesus entende que o encontro fortuito não é válido como prova em nenhuma hipótese. Vicente Greco Filho adota o critério da conexão, continência e concurso de crimes. Como vimos, cremos que o critério da conexão seja válido para resolver a questão. Mas só nas hipóteses de conexão e continência (estritamente interpretadas) é que a prova seria válida. No nosso entendimento, não parece acertada a ampliação para qualquer hipótese de decurso de crimes. Em muitas ocasiões, no concurso material, por exemplo, não contaremos com nenhum tipo de conexão” (grifei).
E mais adiante arremata o autor:
“O critério da conexão ou continência, como se vê, por si só, é adequado para a solução do problema do encontro fortuito. Não é de se cogitar, portanto, de extensão ou ratificação a posteriori pelo juiz. Isso não existe no nosso Direito, que adotou o critério da verificação a priori” (obra citada, p. 195).
Acerca do tema, Damásio E. de Jesus, em artigo publicado na Revista dos Tribunais nº 735, p. 467, orienta:
“Nesse caso, a autoridade policial – ou o MP deve solicitar nova diligência visando à investigação do outro delito. Como diz Luiz Vicente Cernicchiaro, a prova só pode ser utilizada na hipótese mencionada na solicitação, ou seja, ela é imprestável para outro inquérito ou outro processo”. (Boletim do IBCCrim, SP, nº 47/3).
A propósito, em questão assemelhada, agitada nos autos da Reclamação
nº 2002.00.2.007988-4, 1ª Turma Criminal – TJDFT, o ilustre Des. Edson Alfredo Smaniotto, deferiu liminar nos seguintes termos:
“Defiro o pedido de liminar, para determinar a suspensão do Processo nº 469840/2002, que tramita perante o i. Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília (DF), até o julgamento definitivo da vertente reclamação, na medida em que o prosseguimento do feito, com a realização de atos processuais tendentes à ultimação da prestação jurisdicional, poderia importar em malferimento aos princípios da ampla defesa, da estrita acusação e do contraditório (periculum in mora). A relevância da fundamentação decorre da temática trazida à discussão, que alcança questões de ordem constitucional e que estaria a suscitar, em última análise, a validade dos atos processuais que viessem a ser produzidos sem a observância do procedimento que se busca imprimir com a vertente reclamação fumus boni iuris) ...” (grifei).

A QUESTÃO DA
PROVA EMPRESTADA
Com efeito, em tema de prova emprestada, colhe-se de decisões do Supremo Tribunal Federal a visível preocupação em preservar as garantias e liberdades públicas:
“EMENTA: I – Prova emprestada e garantia do contraditório.
A garantia constitucional do contraditório – ao lado, quando for o caso, do princípio do juiz natural – é o obstáculo mais freqüentemente oponível à admissão e à valoração da prova emprestada contra quem se pretenda fazê-la valer; por isso mesmo, no entanto, a circunstância de provir a prova de procedimento estranho à parte contra a qual se pretende utilizá-la só tem relevo se se cuida de prova que – não fora o seu traslado para o processo – nele se devesse produzir no curso da instrução contraditória, com a presença e a intervenção das partes...” (grifei). (HC nº 78749-MS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 25.6.99)
(...)
“Prova emprestada – Inobservância da garantia do contraditório – Valor precário – Processo penal condenatório.
A prova emprestada, especialmente no processo penal condenatório, tem valor precário, quando produzida sem observância do princípio do contraditório...” (grifei). (HC nº 67707-RS, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 14.8.92)
Ainda de prova emprestada, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, decidiu, por unanimidade:
“A prova emprestada, que é a realizada com inobservância dos princípios do contraditório e do devido processo legal, e por isso é qualificada como prova ilícita, não se presta para embasar sentença penal condenatória. ...” (grifei). (HC nº 14274-PR, Rel. Min. Vicente Leal, unânime, DJ 4.6.01).
Na mesma linha de entendimento, ou seja, só reconhecendo validade da prova emprestada, quando presente, na origem, a observância do contraditório, o egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região, também assim tem assentado:
“É válida a prova pericial emprestada de outro processo, quando realizada no mesmo local, com a participação da parte contra quem deva operar, a propósito de tema sobre o qual houve contrariedade. ...” (RO
nº 90.01.05655-5-DF, Rel. Juiz Plauto Ribeiro, DJ 5.9.94)
Precedentes: TRF 1ª R, Ac. nº 94.01.0 9201-0/MG, Rel. Juiz Aloísio Palmeira, DJ 3.6.96; Ac. nº 930116107-9/MG, Rel. Juiz Olindo Menezes, DJ 20.3.98; Ac. nº 95.0 1.36237-0/MG, Rel. Juiz Eustáquio Silveira, DJ 1º.7.98.
O egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, assim também tem decidido, ou seja, reconhecendo validade na prova emprestada quando, na origem, colhida com observância do contraditório:
“...
II – Não estando comprovado durante a instrução do processo que a conduta do apelante tenha sido a causa eficiente do resultado letal, manter a condenação baseada exclusivamente em prova emprestada, extraída de outros autos, e em elementos colhidos inquisitorialmente, é o mesmo que, por via oblíqua, prestar jurisdição sem o devido processo legal. ...” (APR nº 2000.01.3.0013555,
2ª Turma Criminal, Rel. Des. José Divino de Oliveira, unânime, DJ 6.6.01.
Precedentes: TJDFT, APC nº 2001.0 1.1.0483749, 2ª Turma JECC, Rel. Juiz Benito Augusto Tiezzi, unânime, DJ 8.8.02; APC nº 48214/98, 5ª Turma Cível, unânime, Rel. Des. Dácio Vieira, DJ 27.10.99; AGI nº 2001.00.2.0050708, 4ª Turma Cível, Rel. Des. Estevam Maia, DJ 19.6.02.
Pelo que se constata, a prova emprestada só merece prestígio quando colhida sob o pálio do contraditório e do princípio do juiz natural.
E aqui, pede-se vênia para lembrar que mesmo em se considerando a incidência do Contraditório (diferido), recomenda-se a intervenção da defesa “após a coleta do material objeto da interceptação, isto é, depois da produção do documento (contraditório diferido)” (Damásio E. de Jesus, Interceptação de Comunicações Telefônicas – Notas à Lei nº 9.296/96, Revista dos Tribunais, nº 735/49).
Colhe-se mais do citado trabalho:
“Seria infrutífera a busca da prova se, solicitada a medida, fosse intimada a defesa. Cuidando-se de inquérito policial; de natureza inquisitiva e sigilosa, convém que se dê ciência à defesa, se já presente no procedimento, depois da citação do réu. Nesse último sentido: Ada Pellegrini Grinover (painel referido). Antonio Scarance Fernandes, porém, entende que, realizada a diligência durante o inquérito policial, a defesa tem o direito de acompanhar a investigação, não sendo correto que só tome conhecimento da prova depois da citação do acusado (pronunciamento no painel referido). ...” (RT
nº 735/469).

A TESE DA PROPORCIONALIDADE
Neste ponto, torna-se prudente advertir, em tema de prova emprestada e na linha da corrente doutrinária que advoga – com temperamento – a tese da proporcionalidade (teo-ria do balanceamento ou da preponderância de interesses) (Ada Pellegrini Grinover, in As Nulidades no Processo Penal, Malheiros, SP, 3. ed., 1993, p. 115); que:
“deve haver um limite de aplicação da teoria da proporcionalidade, em se levando em conta a sua admissibilidade no sistema pátrio, sob pena de infringir-se o próprio princípio constitucional vedatório de uso processual das provas ilicitamente obtidas. (Cf. Ricardo Raboneze, Provas Obtidas por Meios Ilícitos, Síntese, RS, 4. ed., 2002,
p. 28). Aponta mais a doutrina: “O Ministro Nélson Jobim, do Supremo Tribunal Federal, ao relatar o HC nº 75.338-8 – Rio de Janeiro – com apoio na lição de Benda e Xynopoulos, anota que a proporcionalidade deve ser considerada levando em conta o caso concreto, ministrando que “...o problema está em identificar por onde corre a linha ... entre lo auténticamente privado...” e os demais interesses protegíveis ...” (STF, HC nº 75338-8-RJ, DJ 25.9.98) (Ricardo Raboneze, obra citada, p. 27).
Ademais, cumpre assinalar que a carga de subjetivismo em torno da prevalência dos interesses em confronto em cada caso concreto, em verdade, são fatores intangíveis e que estarão a enfraquecer a tão almejada segurança e estabilidade das relações jurídicas, ainda mais para os que “vêem no princípio da proporcionalidade um parâmetro excessivamente vago e perigoso, para uma satisfatória sistematização das vedações probatórias” (Ricardo Raboneze, obra citada, p. 30).
E arrematando, aduz o autor, com a-
curada precisão:
“Indubitavelmente”, diz ele, “existe o perigo, na definição da fattispecie singular, de que os juízes venham a orientar-se, somente, com base nas circunstâncias particulares do caso concreto e percam de vista as dimensões do fenômeno no plano geral”. De outro lado, insiste, não se deve esquecer que se trata de uma “regra de exclusão que não prescinde da existência de um critério geral.” (Obra citada, p. 30).
Concluindo, é de bom alvitre ressaltar que a aferição da ilicitude da prova, em cada caso, restará fragilizada quando manejada no amplo campo do subjetivismo, como no exemplo em que a Suprema Corte dos Estados Unidos admitiu a prova ilícita, com base na relação custo/benefício, isto é, por entender-se que “o dano causado pela violação era sensivelmente menor que o ganho trazido pela prova” (J. C. Barbosa Moreira, Consulex, nº 135, p. 38).

CONCLUSÃO
Diante de tais considerações, hauridas da doutrina e jurisprudência, conclui-se:
a) que o assegurado direito da inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas, só pode ceder lugar, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal (art. 5°, inc. XII, CF);
b) que a Lei nº 9.296/96 – regulamentadora do inc. XII do art. 5° da CF – estabeleceu no parágrafo único do art. 2°, que “em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, até mesmo com a indicação e qualificação dos investigados...;”
c) que a interceptação telefônica de pessoa não indicada e qualificada na prévia investigação ou processo crime (parágrafo único, art. 2°, Lei nº 9.296/96), constitui-se, iniludivelmente, na quebra de um direito fundamental, com manifesta violação da privacidade, tudo em desacordo com o due process of law (art. 5°, inc. LIV, CF);
d) que eventual elemento de convicção colhido nessa circunstância, em verdade, restará contaminado de eiva inarredável, incapaz de produzir efeito válido no processo (art. 5°, LVI, CF);
e) que o uso como prova emprestada do intitulado “encontro fortuito de outros fatos ou de outros envolvidos”, resultante de interceptação telefônica, utilizada em outro processo (estranho a parte contra a qual se pretende utilizá-la e sem nenhum vínculo de conexão) tem enfrentado fundados obstáculos na hipótese de ter sido produzida com inobservância do contraditório e do princípio do juiz natural (STF, HC 78749-MS, DJ 25.6.99; STF, HC 67.707-RS, DJ 14.8.92; STJ, HC 14274-PR, DJ 4.6.01; TRF, 1ª R, AC 95.01.36237-0-MG, DJ 1º.7.98; TJDF, APR 2000.01.3.0013755, DJ 6.6.01);
f) que deve haver um razoável limite na aplicação do princípio da proporcionalidade (teoria do balanceamento ou da preponderância do interesse), tese esplanada por Ada Pellegrini Grinover, in As Nulidades no Processo Penal, Malheiros, SP, 3. ed., 1993, p. 115, e suscitada quando do julgamento no colendo STF, HC nº 75338-8-RJ, Rel. Min. Nélson Jobim, DJ 25.9.98, visto que “em se levando em conta a sua admissibilidade no sistema pátrio, sob pena de infringir-se o próprio princípio constitucional vedatório de uso processual das provas ilicitamente obtidas. (Cf. Ricardo Raboneze, Provas Obtidas por Meios Ilícitos, Síntese, RS, 4. ed., 2002, p. 28);
g) que, ainda na aplicação do princípio da proporcionalidade, pondera a doutrina que: existe o perigo, na definição da fattispecie singular, de que os juízes venham a orientar-se, somente, com base nas circunstâncias particulares do caso concreto e percam de vista as dimensões do fenômeno no plano geral. De outro lado, insiste, não se deve esquecer que se trata de uma “regra de exclusão que não prescinde da existência de um critério geral.” (Obra citada, p. 30).

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