segunda-feira, 21 de março de 2011

DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA E DA CAUTELAR

Quando se fala em procedimentos judiciais, o que há de mais importante para a garantia e sustentação do Estado de Direito é a observação e obediência ao devido processo legal1, o que aparenta ser inversamente proporcional às pretensões cada vez mais urgentes dos jurisdicionados e do próprio Estado. As pessoas querem respostas rápidas do Poder Judiciário, que acaba, por muitas vezes, para não ferir o ideal do devido processo, tornando a espera longa demais. É inadmissível que o juiz sentencie sem que haja o chamamento processual adequado e válido do réu2, e lhe seja garantida a ampla defesa e o contraditório de forma suficiente, com todos os meios próprios, inclusive a produção de toda modalidade de prova em direito admitidos e uso dos recursos para combater eventuais erros ou omissões do julgador.
Todo esse caminho é aparentemente longo, porém, de observação obrigatória, sob pena de tornar nulo todos os atos praticados após a inobservância de alguns dos preceitos processuais. É o preço que se paga para preservar o Estado de Direito, que se protege sob os auspícios do devido processo legal. Por isso se diz que a demora causada pela observância do devido processo é antagônica aos direitos que se busca preservar junto ao Poder Judiciário, que exigem soluções rápidas.
Apesar de haver inúmeros dispositivos, inclusive constitucionais, acerca da duração razoável do processo, a verdade que se vê nas repartições forenses é que não há tal celeridade desejada impregnada nos atos judiciais e das próprias partes. E, por isso, há quem defenda que a demora processual, desde que observadas todas as garantias constitucionais e extravagantes pelo contraditório e ampla defesa, é aceitável.
Durante o tempo de tramitação de um processo judicial, razoável ou não, é bastante comum que se verifique a perda do objeto ou impossibilidade de adimplemento de obrigações ou cumprimento de sentenças, tornando a tutela jurisdicional simplesmente inútil, fazendo da lei letra morta e sem importância para a parte que não conseguiu fazer valer o seu direito. O perecimento do direito por falta de condições que o permita continuar a existir, dada a mudança de cenários ocorrida durante o percorrer da marcha processual, é constante e, por isso, o uso correto dos institutos da antecipação dos efeitos da tutela e também da cautelar é elementar na prática forense.
A utilização destas ferramentas processuais é precedida de uma forte pressão, já que são consideradas medidas de urgência3, que acabam os profissionais, por muitas ocasiões, a confundirem os dois institutos e fundamentando de maneira inadequada os seus trabalhos, o que, claro, pode, por sua vez, prejudicar o deferimento das pretensões4 ou demonstrar aos interessados a falta de técnica processual. É óbvio que nos fóruns e tribunais existe grande quantidade de decisões que também são fundamentadas com a técnica errada, e, portanto, estudos comparativos são cada vez mais necessários ao aperfeiçoamento do trabalho jurisdicional, o que traz, assim, satisfação àqueles que buscam a tutela do Poder Judiciário.
O objetivo deste trabalho não é, nem de longe, esgotar toda a discussão sobre o tema, mas tão somente traçar parâmetros comezinhos e auxiliar na busca pelas pretensões de urgência.

DA NATUREZA JURÍDICA
O que primeiro deve integrar o estudo comparativo da antecipação dos efeitos da tutela em face da cautelar é a natureza jurídica de ambas, para confrontar a razão principal que as trouxe ao ordenamento processual brasileiro e, assim, proporcionar a escolha correta do procedimento para a busca da tutela de urgência adequada ao caso.
Dessa forma, proponho o início do estudo pelo instituto da antecipação dos efeitos da tutela, que é prevista no art. 273 do Código de Processo Civil. Segundo o dispositivo, a requerimento do autor, o juiz poderá antecipar os efeitos daquilo que poderá ser concedido na sentença, como forma clara de tentar minimizar a demora no andamento da marcha do processo. Trata-se de ato que implica sérias consequências, podendo até demonstrar predisposição do juízo em julgar a demanda procedente, e, por isso, exige rígidos requisitos para seu deferimento, como será objeto de estudo adiante.
Não implica, o deferimento, em desrespeito aos ideais do devido processo legal, já que ele, na maioria das vezes, desafia recursos interlocutórios. Nas poucas vezes que não houver recurso cabível, como em alguns procedimentos trabalhistas ou nos previstos na Lei nº 9.099/95 (Juizados Especiais), pode ser facilmente afrontado por mandado de segurança ou embargos declaratórios, que, segundo a corrente dominante, já são admitidos como recurso de decisões interlocutórias. Nesse sentido, Luiz Orione Neto traz em sua obra5 julgado do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira6, do Superior Tribunal de Justiça, no qual se admitiu a interposição dos embargos declaratórios em face de qualquer tipo de decisão, inclusive com a respectiva interrupção do prazo recursal7.
Apesar de toda a rigidez dos requisitos para a concessão, a decisão que antecipa os efeitos da tutela não é definitiva, e só poderá ser deferida nos casos que a medida possa ser desfeita. Marcus Cláudio Acquaviva, citando José Carlos Barbosa Moreira8, leciona que se exclui a antecipação quando essa se mostrar irreversível. E é isso que está estampado na própria legislação processual, no corpo complementar do art. 273:
“§ 2o Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.”

Dessa forma, há de considerar com parte de sua natureza jurídica a precariedade ou provisoriedade, já que pode se revogada ou modificada a qualquer tempo por despacho fundamentado9. Em todo o caso, ela é exequível, enquanto válida, imediatamente e de forma independente, sem necessidade de procedimento próprio, podendo ser dita como autônoma por isso, apesar de subsidiária ao procedimento todo.
Sua principal razão de existir é a possibilidade de antecipar, mesmo que apenas parcialmente, as pretensões do autor. Como exemplo disso, uma ação declaratória de inexistência de débito, que tem o objetivo de desconstituir dívida que não foi contraída ou que já foi paga, pode ter como antecipação de tutela a determinação do juiz para que o suposto credor suspenda quaisquer tipos de cobrança ou de negativação do nome do autor nos organismos de restrição ao crédito, sob pena, inclusive, de multa.
Dessa forma, o autor, mesmo antes do aperfeiçoamento do processo com a citação, para o desenvolvimento válido do devido processo legal, poderá se ver livre das cobranças e das restrições. Tal decisão tem de ser cumprida imediatamente, pelo simples motivo de a medida ter sido deferida, independente de qualquer outra providência, devendo, portanto, conter os requisitos práticos para seu aperfeiçoamento, tais como ordens de intimações para cumprimento ou notificações para diligências por terceiros.
Como a antecipação dos efeitos da tutela, por sua natureza autônoma, não exige atos pela parte para cumprimento, objetivando evitar desobediência da ordem, poderá o juiz fixar penas para o caso de descumprimento, como multa diária, por exemplo, aplicada em favor do autor, para o caso de descumprimento. É uma forma de garantir a efetiva aplicação da tutela jurisdicional ao caso urgente, que não pode mais, após o deferimento, deixar de atender aos interesses do autor.
Pode ser requerida em qualquer momento processual, e não só na peça de início, e ser deferida até mesmo na sentença, o que inibe a incidência do efeito suspensivo no caso de interposição de recursos10.
Já a cautelar não tem o objetivo de antecipar os efeitos da sentença, mas garantir que a sentença prolatada seja adimplida. Trata-se de medida assecuratória e pode ser proposta antes da ação principal, na modalidade de preparatória, ou durante o curso dela, como incidental. Em todos os casos serve de prevenção ao direito postulado. Diferente da antecipação dos efeitos da tutela, que só se admite requerimento pelo autor, na cautelar, pode também o réu ou terceiros interessados buscar salvaguardar possíveis direitos.
A demora pela entrega da prestação jurisdicional, independentemente do tempo do processo, pode permitir que objetos se percam, pessoas morram, ativos desapareçam e direitos se percam. Essa mudança de quadro durante a marcha processual pode fazer perder o objeto da ação, ou fazer com que a sentença seja inexequível, o que corresponde ao mesmo que a não satisfação da pretensão do postulante, tornando todo o procedimento imprestável e o tempo e recursos gastos como desperdício.
Assim, a natureza principal da cautelar é a proteção jurisdicional em garantir efetivamente a entrega jurisdicional da pretensão na ação principal. Não sabe se razão cabe ou não ao requerente da cautelar, mas desde que preenchidos os requisitos, deve ela ser deferida. O juiz, tendo dúvidas acerca do direito invocado, poderá exigir, para deferimento da cautela, caução real ou fidejussória11.
Cessa sua eficácia, se preparatória, quando o autor não propõe a ação principal no prazo de 30 dias, contados da efetivação da medida, se não for executada também no prazo de 30 dias, ou quando o juiz declara extinto o processo principal. Seu deferimento, pela natureza preventiva, não exige cumprimento ou exigibilidade, dando por cumprida, geralmente com intimações, notificações ou averbações.
Seu pedido, tanto na modalidade preparatória, como também na incidental, deve ser feito em autos apartados e tem procedimento especial para seguir. A exceção está na regra do §7º do art. 273 do Código de Processo Civil, no qual, havendo pedido pelo autor de antecipação dos efeitos da tutela, cuja natureza jurídica seja assecuratória, poderá o juiz deferir cautelar, desde que preenchidos os seus requisitos. Dessa forma, a cautelar será incidental e nos próprios autos processuais da ação principal, que, na verdade, será a ação única. Apesar de o dispositivo vir prevenir eventuais equívocos na formulação de pedidos urgentes, em respeito ao princípio da economia processual, a parte poderá pleitear a cautelar incidental nos próprios autos da ação principal, sob o título de antecipação de tutela, invocando tal diploma12, sem que fique caracterizada falta de perícia processual.

REQUISITOS
O deferimento da antecipação dos efeitos da tutela exige o preenchimento de firmes requisitos, difíceis de se alcançar no momento inicial da demanda, e por isso pode ser requerida em qualquer momento processual, inclusive na fase recursal. O autor deve ter simultaneamente a prova inequívoca do direito alegado, convencer o juiz da verossimilhança de sua postulação e alternativamente haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou ainda, que fique caracterizado o abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu.
O juiz não pode antecipar os efeitos da tutela se a medida for irreversível, já que a legislação diz que ela poderá ser revogada ou modificada a qualquer instante em despacho devidamente fundamentado, devendo a situação de fato voltar ao estado que estava antes do deferimento, e há ainda vedação expressa ao deferimento da antecipação quando se trata de medida que não pode ser desfeita13.
Diz de prova inequívoca aquela na qual não há elementos técnicos ou de fato que possam ser facilmente rechaçados, como, por exemplo, um documento que tenha fé pública, ou que tenha sido emitido pelo próprio réu, ou seja, seu conteúdo não é discutível. Nas relações de consumo, dada a possibilidade de inversão do ônus da prova, pode também o magistrado deferir antecipação postulada, mesmo sem a prova inequívoca, cabendo àquele cujo ônus incide demonstrar a falta de sustentabilidade do direito invocado pelo autor, ficando, nesse caso, encarregado de apresentar prova inequívoca contrária ao pedido inicial.
Dá-se também a prova inequívoca quando o documento juntado pelo autor é também juntado pelo réu, como no caso de um contrato, em que ambos ficaram com uma cópia, podendo a antecipação de tutela se fazer após a contestação, quando não se faz no momento da análise inicial.
Outras provas, mesmo que não tendo fé pública e nem sequer tendo sido produzidas pelo réu ou serem documentos comuns, podem ter natureza inequívoca, facultando-se ao magistrado a livre apreciação, podendo fundamentar dessa maneira o pedido de tutela antecipada. Nesse sentido, o art. 131 do Código Civil é claro:

“O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que Ihe formaram o convencimento.”

Assim, qualquer prova que, por sua força, leve o juiz a acreditar na alegação do autor, mesmo que em uma análise superficial permita dar-se equivocidade, enseja o deferimento da antecipação.
A exigência tão firme e inamovível dessa modalidade de prova, em um momento de decisão antecipatória, faz-se pela natureza jurídica do instituto, que não objetiva proteger o direito postulado, mas dar de pronto ao autor aquilo que só seria possível após o exercício completo do devido processo legal.
A prova inequívoca não tem a mesma natureza jurídica do fumus bonis iuris da cautelar, já que tem de ser, numa interpretação preliminar, intocável, enquanto a outra deve apenas apresentar indícios de sustentabilidade do direito, e não prová-lo de maneira inquestionável. Nesse sentido, leciona Kazuo Watanabe14:

“Mas um ponto deve ficar bem sublinhado: prova inequívoca não é a mesma coisa que fumus bonis iuris do processo cautelar. O juízo de verossimilhança ou de probabilidade, como é sabido, tem vários graus, que vão desde o mais intenso até o mais tênue. O juízo fundado em prova inequívoca, uma prova que convença bastante, que não apresente dubiedade, é seguramente mais intenso que o juízo assentado em simples fumaça, que somente permite a visualização de mera silhueta ou contorno sombreado de um direito.”

O requerimento de antecipação dos efeitos da tutela las­treado no fumus bonis iuris ou o deferimento nesse sentido fere de morte os firmes requisitos do art. 273, muito mais exigentes ao deferimento15 dentro da técnica adequada desta, salvo se o pedido tiver natureza cautelar, hipótese na qual poderá ser deferida em caráter incidental, nos próprios autos processuais, conforme autoriza o § 7º.
Já ao tratar da verossimilhança, também como requisito complementar ao deferimento da antecipação, há de esclarecer que nada mais é que o conjunto de elementos constantes dos autos a indicar que a narrativa inicial pode ser verdadeira, tal como se faz no fumus bonis iuris. São indícios de que o autor tem razão, e que apontem no possível julgamento pela procedência do pedido inicial. É claro que a falta de verossimilhança no requerimento de antecipação, feito antes da sentença, que enseja o indeferimento da tutela antecipatória, não pode traduzir em improcedência do pedido na decisão última do juiz, devendo o juízo ser imparcial, para que, durante a instrução, possam surgir provas do direito alegado fundamentando a pretensão do autor.
A verossimilhança tem o papel de relações públicas do direito postulado e deve trazer uma imagem de vitória relacionada ao direito do postulante. Entre as circunstâncias processuais, dentro das possibilidades de vitória ou fracasso na demanda, a verossimilhança faz parecer intuitivamente verdadeiro.
Trata-se de um juízo de probabilidades, no qual, ao se examinar o pedido de antecipação, o juiz, com sua experiência, mas sem entrar profundamente no mérito, examina a questão com as reais chances do autor. Quando a probabilidade, em uma análise anterior à instrução processual, indica possível vitória ao autor, naquelas condições, dá-se a verossimilhança.
Não pode ser considerada verossimilhança a certeza absoluta pela procedência do pedido, dada a possibilidade de deferimento da antecipação em qualquer fase processual, inclusive antes de citado o réu, já que isso implicaria em juízo antecipado da lide, e tornaria o magistrado suspeito, nos termos do art. 135, V, do Código de Processo Civil, mas apenas a presunção de que possam ser verdadeiras as alegações do autor.
E, além da prova inequívoca e verossimilhança, tem de haver, para o deferimento da pretensão antecipatória, o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (inciso I), ou alternativamente que fique caracterizado o abuso do direito de defesa ou manifesto interesse protelatório do réu.
Fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação é o possível prejuízo do autor ou perda, mesmo que parcial, do direito que esse postula, em decorrência da demora na satisfação plena do direito. Dessa forma, a lenta marcha do processo, que objetiva a entrega da prestação jurisdicional, ocasionada pela prática de todos os atos relativos ao devido processo legal, sendo o elemento que poderá causar o perecimento do objeto, desde que presentes os demais requisitos para o deferimento, impõe o deferimento da antecipação.
A dosimetria principal no deferimento da tutela antecipada em relação ao fundado receio pelo dano de difícil reparação ou até irreparável tem parcial importância na simples afirmação da parte, quando se trata de medidas protetivas da honra ou que tenham ligação direta ao subjetivo do indivíduo, tal como a importância da integralidade do seu nome, por exemplo. É claro que a aplicação técnica, pelo magistrado, do instituto ao caso concreto, deve observar o conjunto completo da situação para evitar excessos, mas o fundado receio de danos é matéria de ordem fática, e para uma análise primeira, muitas vezes antes da citação, a prova de que o indeferimento da medida pode causar prejuízos ao autor ainda não foi constituída. Nesse caso, a palavra da parte deve ser também suficiente para caracterizar o receio de dano.
Aliás, quando a lei traz em seu texto o termo “receio”, tem-se daí o propósito da norma. Em linhas gerais, receio é sinônimo de medo, incerteza, temor, dúvida. Assim sendo, havendo dúvida ou incerteza de que a entrega da prestação somente ao final do procedimento poderá causar danos ao autor, há possibilidade de deferir a antecipação. Não é necessário que exista prova nos autos de tal medo ou incerteza, bastando para tanto apenas a fundamentação16. Portanto, a afirmação da parte tem especial importância para o deferimento da tutela antecipada, vetado ao juiz, de ofício, trazer estes elementos para a decisão, impondo à parte explicar as razões para se deferir o pedido. Aliás, é por essa razão que o instituto não é matéria de ordem pública, mas sim de requerimento exclusivo do autor, a subjetividade dos danos que a demanda pode causar por sua demora só pode ser medida pelo possível prejudicado.
Alternativamente ao fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, pode a antecipação ser deferida caso o réu abuse do seu direito de defesa, ou que fique caracterizado o manifesto propósito de alongar ainda mais a demanda.
Tal instituto deve ser analisado com muita calma, para que o magistrado não prejudique o direito constitucional ao contraditório e ampla defesa, com os meios próprios garantidos na Carta, e aplicado sempre em conjunto ao art. 17 do Código de Processo Civil, com algum dos incisos, reputando o réu litigante de má-fé, arbitrando a multa constante do art. 18, que não poderá exceder a um por cento do valor da causa com a respectiva indenização por prejuízos que eventualmente tenha causado.
Noutras palavras, em percebendo o magistrado o manifesto interesse de tornar o processo mais longo, com o uso de recursos desnecessários, usando incidentes ou qualquer outro artifício com o objetivo de transformar a entrega da prestação jurisdicional tardia, poderá o magistrado, desde que presentes a prova inequívoca e verossimilhança, antecipar os efeitos da tutela pretendida, condenar o réu no pagamento de multa, e, por fim, fixar indenização pelo danos sofridos pelo autor.
Diferente do fundado receio de dano, que deve ser arguido pela parte, e tem especial importância no conjunto para o deferimento, o interesse protelatório pode ser observado de ofício, e, em havendo requerimento pela antecipação, poderá, o magistrado, buscar esse elemento nos autos e fundamentar o despacho concessório, sem que necessariamente o autor tenha tratado do assunto.
A cautelar, diferentemente da antecipação dos efeitos da tutela, já em uma metodologia bem mais simples, tem requisitos menos rígidos para o deferimento, bastando estar demonstrado um indício que o direito pleiteado tem fundamento, fumus bonis iuris, e que há eminente perigo caso não seja tal providência tomada imediatamente, que é o clássico periculum in mora. Não pode o magistrado considerar, para deferimento da medida, a possibilidade real de vitória do postulante da cautelar, para deferimento da liminar, mas apenas o preenchimento do conjunto de requisitos necessários, e por isso verifica-se a simplificação do instituto em face da antecipação dos efeitos da tutela, na qual o magistrado dá ao autor, desde já, aquilo que só se alcançaria ao final do processo.
Como já dito, trata-se de medida que faça a proteção efetiva de um possível direito, preservando-o para satisfação dos pretensos direitos postulados pelas partes. Diz ser preparatória, se proposta antes do pedido principal em ação autônoma, ou incidental, se proposta no decorrer da demanda ou se formulada sob o título de antecipação dos efeitos da tutela, nos próprios autos principais, nos termos do art. 273, §7º, do CPC. Em todos os casos, os requisitos são os mesmos.
A lei processual não exige uma prova inequívoca para concessão da liminar em ação cautelar, como o faz nos pedidos de antecipação dos efeitos da tutela (art. 273), e, portanto, havendo o receio da lesão, e cumulativamente o perigo da demora com o indicativo de que existe direito à pretensão do requerente, deverá o juiz deferir liminarmente o pedido.
Apesar da celeridade da cautelar, comparando-a a outros ritos, a demora pode produzir prejuízos à parte, e pior, pode levar ao perecimento do seu direito. O Professor Wilson Gianulo17 diz ser “a locução latina que designa uma situação de fato, caracterizada pela iminência de um dano, em face da demora de uma providência que o impeça. Trata-se, portanto, de um ato em potência”.
Por ser ato em potência, a simples possibilidade de ocorrer basta para o deferimento da medida, não sendo necessária firme demonstração de que o ato vai certamente acontecer. É um juízo apenas de possibilidades, e por isso pode causar prejuízos a qualquer das partes, facultando ao magistrado, quando da análise, a exigência de caução18, que pode ser na modalidade real ou fidejussória.
Outro requisito e fundamento necessário à concessão da liminar na ação cautelar é o fumus boni iuris. Gianulo19 o define como sendo “indício ou possibilidade da existência do direito”. Não é preciso prova literal ou título líquido, certo e exigível para o deferimento da cautelar, mas que demonstre o requerente que sua pretensão tem amparo legal. É um juízo de aproximação, e mais uma vez pode o juiz usar do instituto da caução para evitar danos e lesões às partes.
Também é importante salientar que, exceto na medida descrita no art. 273, §7º, do CPC e na cautelar requerida na modalidade incidental autônoma, é requisito para a manutenção da liminar deferida a propositura, no prazo de 30 dias, da ação principal onde pretende constituir o seu direito.
A estrutura da peça inicial da ação cautelar também possui requisitos próprios diferentes da ação que postula a antecipação dos efeitos da tutela. Segundo comandos legislativos, a peça deve trazer a lide e o seu fundamento (CPC, art. 801, III); a exposição sumária do direito ameaçado e o receio da lesão (IV); fora isso, os demais itens são comuns ao procedimento ordinário, como previstos no art. 282 do Código de Processo Civil.

RECURSOS
Para as decisões que deferem ou indeferem tanto a antecipação dos efeitos da tutela ou a liminar no pedido cautelar, podem, todas, serem revistas por meio de agravo do instrumento. Mesmo considerando as modificações trazidas pela Lei nº 11.187, de 2005, que alterou a estrutura dos recursos em face de decisões interlocutórias, há ainda a modalidade de instrumento para decisões que podem causar dano, lesão grave ou de difícil reparação à parte20.
Eis que qualquer pedido de antecipação de tutela deve ser fundamentado, dentre outros elementos, pelo fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, enquanto a cautelar fundamentada com a demonstração do perigo da demora. Dessa forma, o indeferimento sempre vai agredir eventuais direitos que podem se perder com o decurso do tempo, habilitando o recurso de instrumento.
Quando do exame ao agravo de instrumento, é inadmissível ao relator a conversão na modalidade retida, já que tão somente a parte pode valorar a difícil reparação ou os efeitos do indeferimento para satisfação do seu direito. Nas medidas nas quais haja caução em garantia real ou fidejussória, a ideia é de que não há mais perigo com a demora, hipótese em que a possibilidade de uma lesão com reparação dificultosa é quase inexistente, possibilitando ao magistrado a conversão do agravo na forma retida. 
NOTAS
1 O princípio do devido processo legal está garantido na Constituição Federal, no art. 5°, LIV, e chegou ao direito brasileiro por meio do ideal due process of law – do justo processo. A expressão due process of law é utilizada para explicar e expandir os termos vida, liberdade e propriedade e para proteger a liberdade e a propriedade contra a legislação opressiva ou não razoável. Ferir o princípio do devido processo legal constitui violação indireta aos princípios do contraditório e da ampladefesa (CF/88, 5°, LV).

2 Salvo casos previstos no art. 285-A do Código de Processo Civil, hipóteses de indeferimento da petição inicial ou procedimentos de jurisdição voluntária.

3 Serão tratados adiante os requisitos para concessão da antecipação dos efeitos da tutela e da cautelar, e verificar-se-á que é exigido, na primeira, que haja risco de fundado receio de dano irreparável ou difícil reparação, e, na segunda, o clássico perigo da demora, levando ao entendimento de que o não deferimento de tais medidas importarão em perecimento do direito.

4 “O despacho que defere liminarmente a antecipação de tutela com apoio, apenas, na demonstração do fumus bonis iuris e do periculum in mora malfere a disciplina do art. 273 do CPC, à medida que deixa de lado os rigorosos requisitos impostos pelo legislador para a salutar inovação trazida pela Lei nº 8.952/94.” (STJ – Recurso Especial nº 131.853 SC – 3ª Turma – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito)

5 Recursos Cíveis. Saraiva, 2002, p. 421.

6 EDecl no REsp nº 159.317-DF.

7 Decisão interlocutória. Os embargos declaratórios são cabíveis contra qualquer decisão judicial e, uma vez interpostos, interrompem o prazo recursal. A interpretação meramente literal do art. 535 do CPC atrita com a sistemática que deriva do próprio ordenamento processual, notadamente após ter sido erigido a nível constitucional o princípio da motivação das decisões judiciais.

8 O Novo Processo Civil Brasileiro. 22. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, pp. 87/88.

9 Código de Processo Civil, art. 273, § 4º

10 A Lei nº 10.352, de 26.12.01, fez incluir o inciso VII no art. 520 do Código de Processo Civil, determinando o recebimento da apelação tão somente no efeito devolutivo, quando o recurso atacar decisão que antecipou os efeitos da tutela.

11 Código de Processo Civil, art. 804.

12 Código de Processo Civil, art. 273, 7º.

13 Código de Processo Civil, art. 273, § 2º.

14 Reforma do Código de Processo Civil (Coordenação de Sálvio de Figueiredo), p. 33.

15 (STJ – Recurso Especial nº 131.853 SC – 3ª Turma – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito)

16 O dispositivo constante do inciso I do art. 273 trata do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. O termo fundado, utilizado como adjetivo, tem significado de que o receio de dano tenha fundamento, ou seja, fundamentação.

17 Processo Cautelar e Antecipação de Tutela. Jurídica Brasileira, pp. 30 e 31

18 Código de Processo Civil, art. 799. No caso do artigo anterior, poderá o juiz, para evitar o dano, autorizar ou vedar a prática de determinados atos, ordenar a guarda judicial de pessoas e depósito de bens e impor a prestação de caução.

Art. 804. É lícito ao juiz conceder liminarmente ou após justificação prévia a medida cautelar, sem ouvir o réu, quando verificar que este, sendo citado, poderá torná-la ineficaz; caso em que poderá determinar que o requerente preste caução real ou fidejussória de ressarcir os danos que o requerido possa vir a sofrer.

19 Ob. cit.

20 Código de Processo Civil, art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento. (Redação dada pela Lei nº 11.187, de 2005)

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