sexta-feira, 15 de abril de 2011

TRÂNSITO VIOLÊNCIA E IMPUNIDADE

Ricardo FerraçoSenador da República (PMDB-ES).
O Carnaval de 2011 foi o mais violento dos últimos anos e rendeu manchetes nos principais jornais do País. Só nas estradas federais foram 4.165 acidentes, com 2.441 feridos e 213 mortes – muito mais que no ano passado, quando morreram 143 pessoas. E é bom lembrar que o balanço feito pela Polícia Rodoviária Federal não inclui as rodovias estaduais nem as vias municipais, onde os acidentes com mortes também se multiplicaram.
Por trás dos números estão histórias dramáticas. O ônibus que se chocou com um caminhão em Santa Catarina, matando 27 pessoas. O motorista bêbado que capotou o carro, causando a morte do sobrinho de 14 anos e deixando feridos outros quatro adolescentes, no Espírito Santo...
São muitas e muitas histórias que tiram parte do brilho do nosso Carnaval e trazem mais uma vez à tona os problemas de sempre: a desatenção e a imprudência dos motoristas; a falta de campanhas educativas permanentes; a fiscalização falha e a má conservação das estradas. Este ano, a chuva forte e o aumento absurdo do fluxo de veículos, por causa do aquecimento da economia, agravaram o cenário de violência nas estradas.
Certo é que não podemos continuar contando e lamentando os mortos no trânsito apenas em feriados prolongados. Por que não nos escandalizamos com os cerca de 100 brasileiros que morrem diariamente, em decorrência de acidentes de carro? A Polícia Rodoviária lembrou bem: é como se um avião lotado explodisse a cada três dias no Brasil...
Multiplicadas ao longo de um ano, contam-se mais de 36 mil mortes nas ruas e estradas do País. Não é exagero algum dizer que o trânsito no Brasil mata mais que qualquer guerra, qualquer catástrofe natural. O que mais causa espanto, porém, é que se trata de uma “tragédia anunciada”, expressão essa até comum quando se fala de violência no trânsito.
O que podemos esperar quando multiplicamos, numa velocidade espantosa, o número de carros nas ruas sem uma formação adequada dos condutores? O que podemos esperar se não apostamos em campanhas permanentes de educação no trânsito? Basta dizer que, antes do Carnaval deste ano, o Departamento Nacional de Trânsito só fez campanha de prevenção de acidentes em três capitais: Rio de Janeiro, Recife e Salvador.
E como justificar o fato de ainda não termos regulamentado a educação de trânsito nas escolas, prevista há anos no Código de Trânsito Brasileiro? E a inspeção veicular, também prevista no CTB? Será que pesa tanto assim no orçamento público a modernização do sistema rodoviário, com a consequente implantação de uma fiscalização mais rigorosa?
Mas o pior de tudo é a impunidade, que alimenta a imprudência e a irresponsabilidade. É muito difícil um motorista ser condenado por crime de trânsito, que é considerado culposo, ou seja, sem intenção de matar. Ele paga fiança, arruma um bom advogado e, em vez de ir para a prisão, acaba prestando serviço à comunidade ou doando algumas cestas básicas.
Motorista bêbado ou drogado que provoca acidente comete crime doloso, é evidente. Afinal, assumiu um risco calculado de ferir ou matar alguém quando fez uso de substância que, reconhecidamente, dá uma falsa sensação de segurança, diminui a coordenação motora, os reflexos e a habilidade de avaliar velocidades e distâncias. Vale observar que, de acordo com especialistas, nada mais nada menos que metade das mortes por acidentes no trânsito estão relacionadas ao uso do álcool. E também lembrar o Mapa da Violência, divulgado recentemente pelo Ministério da Justiça. A maior parte dos acidentes e das mortes no trânsito acontece nos finais de semana e envolve motoristas jovens. É a turma que vem da festa, da boate, que “tomou todas” no bar, no churrasco com os amigos.
O problema do álcool não costuma ser tão grave nas estradas. Mesmo assim, merece destaque a estatística da Polícia Rodoviária Federal, na Operação Carnaval deste ano: um em cada 32 motoristas flagrados pela fiscalização estava embriagado – 479 foram presos por embriaguez!!
E a Lei Seca? Será que depois de tanto estardalhaço ela não vai “pegar”? Sim, porque no Brasil temos desses absurdos – “lei que pega” e “lei que não pega”. O certo é que o medo inicial de ser flagrado no teste do bafômetro vem sendo substituído pela certeza de que a fiscalização é falha e pela “esperteza” de contornar as blitzes usando o twitter.
A Lei Seca também corre o risco de ser esvaziada pela brecha legal, segundo a qual ninguém é obrigado a produzir provas contra si próprio. Aí temos a situação absurda do motorista visivelmente embriagado, que escapa da fiscalização por recusar-se a fazer o teste do bafômetro.
Se queremos uma lei séria, que cumpra realmente seu objetivo, temos que baixar o limite de tolerância de álcool no sangue para zero. Hoje, esse limite é de seis decigramas, e para medir o nível de álcool no sangue só mesmo com o uso do bafômetro ou a realização de exame de sangue. Se a tolerância for zero, será possível comprovar a embriaguez por meio de vídeos ou testemunhos de terceiros.
Temos também que estabelecer penas mais duras para quem assume, deliberadamente, o risco de provocar um acidente e até a morte quando bebe e dirige. Não dá para ser conivente com a imprudência, com a irresponsabilidade.
Um projeto de lei (PLS nº 48/11) de minha autoria, em trâmite no Senado Federal, visa deixar a Lei Seca mais rigorosa. E é para dar um fim à impunidade e ajudar a reduzir essa escalada absurda da violência no trânsito que creio ser importante um debate cuidadoso em torno desse projeto.
Não podemos ser cúmplices da impunidade. Nem é justo que continuemos apenas chorando nossos mortos no trânsito, de braços cruzados, sem fazer nada.

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