domingo, 26 de fevereiro de 2012

A responsabilidade dos Bancos pelos danos provocados à terceiros em razão de fraude na realização de financiamentos

Um belo dia, uma pessoa comum, ao tentar fazer o financiamento de um bem, descobre que o seu nome esta negativado, inscrito no cadastro de inadimplentes (SPC/SERASA). Ainda tomada pelo susto e constrangimento da descoberta, essa pessoa busca informações a respeito do motivo de sua inscrição. A pessoa acaba descobrindo que o seu nome foi negativado porque um terceiro conseguiu fazer um financiamento em seu nome e acabou, por óbvio, não pagando as parcelas do mesmo.

Os fatos relatados acima tem se tornado cada vez mais frequentes. Pessoas tem seu nome irregularmente inscrito no cadastro de inadimplentes porque um terceiro, de forma fraudulenta, conseguiu realizar um financiamento em seu nome.

As Instituições Financeiras, quando acionadas judicialmente pelas pessoas que tiveram seu nome irregularmente inscrito no cadastro de inadimplentes, em sua defesa, normalmente alegam que tomaram todos os cuidados para evitar que aquilo tivesse acontecido e que também foram vítimas do fraudador, agindo como se não tivessem qualquer responsabilidade pela irregular inscrição no Cadastro de Inadimplentes.

Em casos assim a Jurisprudência Nacional tem entendido que as Instituições Financeiras devem responder pelos danos à honra decorrentes da irregular inscrição do nome do indivíduo no Cadastro de Inadimplentes em virtude de um financiamento realizado por terceiro por causa sua responsabilidade objetiva em razão do risco do negócio.

Quando falamos em responsabilidade objetiva dizemos que o fornecedor de produto ou prestador de serviço será responsabilizado, independente de sua culpa, pelos danos provocados por seus produtos ou serviços, sobretudo quando a prestação de sua atividade, em razão de sua natureza, implicar em risco aos direitos alheios.

Esse conceito se amolda perfeitamente nos casos dos financiamentos. É óbvio que em tais negócios sempre existirá o risco de uma tentativa de fraude, bem como é cristalino que ocorrendo fraude existe uma enorme probabilidade de que o direito de terceiros seja atingido.

Vejamos no presente julgado a aplicação deste entendimento:

RESPONSABILIDADE CIVIL Dano moral Restrição de crédito decorrente de indevida inscrição do CPF do autor no cadastro de devedores inadimplentes do SERASA Dívida inexistente Uso de seus dados pessoais por terceiro em fraude na contratação de financiamento para compra de mercadoria Dever de indenizar reconhecido com base no princípio jurídico da responsabilidade objetiva, em razão do risco do negócio Cerceamento de defesa Inexistência Excludentes da culpa exclusiva do ofendido ou de terceiros não evidenciados Indenização Fixação que deve ser apta para desestimular a reiteração de atos gravosos, sem, no entanto, constituir fonte de enriquecimento desproporcional à vítima Montante de R$ 11.179,70 Apelo desprovido. 
(3777885720088260577 SP 0377788-57.2008.8.26.0577, Relator: Galdino Toledo Júnior, Data de Julgamento: 28/06/2011, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/06/2011) (Destaquei)

Vale destacar interessante trecho do acórdão da decisão acima:

"... O fato de a ré ter obedecido aos procedimentos usuais em operação dessa natureza não significa que o serviço por ela prestado não tenha sido defeituoso. Pelo contrário, fatos como os narrados nestes autos somente demonstram que essas rotinas administrativas são insuficientes para evitar a ocorrência de fraude, mediante o uso de documentos falsos.


Na verdade, ao permitir a abertura de financiamento, aqui representado por cédula de crédito bancário, ao consumidor que se lhe apresenta como interessado (fl. 75),está a empresa ré se utilizando de meio para captar clientela, com o que assume o risco por eventual serviço defeituoso, como na hipótese dos autos." (Destaquei)

Vejamos outras decisões nesse sentido:


RECURSO DE AGRAVO - INSCRIÇÃO INDEVIDA SERASA - FRAUDE DE DOCUMENTOS - RISCO DO NEGÓCIO - VALOR DEVIDO A TÍTULO DE DANO MORAL - REDUÇÃO DO VALOR ARBITRADO - DESCABIMENTO - MANUTENÇÃO DA DECISÃO.1. A inclusão indevida do nome do agravado no órgão de proteção ao crédito consiste em ato ilícito compensável por meio de indenização por dano moral. Obedecendo ao critério da razoabilidade, seguindo jurisprudência deste tribunal e observando a extensão do dano e as condutas ilícitas do Banco e da Financeira, tudo isso sem dar ensejo ao enriquecimento ilícito, mantém-se o quantum devido a título de danos morais em R$ 10.000,00.2. A atividade bancária assim como as operadoras de factoring, em razão de estarem a par das atividades que exercem, correndo o risco do negócio, não cabem a alegação de culpa de terceiros ou mesmo exclusiva do consumidor inocente. Respondem solidariamente por não utilizarem de mecanismos de segurança necessários as suas atividades.3. Recurso não provido à unanimidade.
(1879270 PE 0001044-26.2011.8.17.0000, Relator: Francisco Eduardo Goncalves Sertorio Canto, Data de Julgamento: 07/04/2011, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: 72) (Destaquei)



RESPONSABILIDADE CIVIL Dano moral Empresa de telefonia Restrição de crédito decorrente de indevida inscrição do nome da autora, pessoa jurídica, no cadastro de devedores inadimplentes do SERASA Ausência de impugnação específica e de provas da existência da dívida Indevida habilitação de terminais telefônicos não contratados que afasta a contraprestação pelos serviços supostamente disponibilizados Fraude na contratação dos serviços em nome da autora, fato admitido pela ré Dever de indenizar reconhecido com base no princípio jurídico da responsabilidade objetiva, em razão do risco do negócio Excludentes da culpa exclusiva do ofendido ou de terceiro não evidenciados Indenização Aplicação da súmula 227 do C. STJ - Fixação que deve ser apta para desestimular a reiteração de atos gravosos, sem, no entanto, constituir fonte de enriquecimento Arbitramento em R$que se mostra adequado Apelo parcialmente provido.
(1642491320108260100 SP 0164249-13.2010.8.26.0100, Relator: Galdino Toledo Júnior, Data de Julgamento: 26/07/2011, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/07/2011) (Destaquei)




APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO. FRAUDE.  INSCRIÇÃO INDEVIDA NO SPC. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. TEORIA DA APARÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA RELAÇÃO JURÍDICA. INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO. 
1. A FAI FINANCEIRA AMERICANA ITAÚ é uma associação entre as Lojas Americanas e o Banco Itaú, oferecendo produtos como cartões de crédito, financiamentos e empréstimos pessoais, ou seja, as duas empresas estão interligadas pela mesma cadeia de serviço prestado e as suas atividades confundem-se aos olhos do consumidor.
2. A adesão ao cartão de crédito é realizada nas dependências das Lojas Americanas, razão pela qual deve ser aplicada ao caso em tela a Teoria da Aparência, considerando-se a boa-fé do consumidor, que acredita ser as “Lojas Americanas” a empresa que administra o cartão.
 Legitimidade passiva “ad causam” reconhecida. Desnecessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário. 
3. A loja ré não impugnou os fatos narrados na inicial, tampouco forneceu os documentos necessários comprobatórios da inexistência de relação jurídica que alegou. 
4. Cabe à loja tomar as providências necessárias, a fim de evitar a prática de fraude por terceiro.  
5. Configurada a deficiência do serviço, que não fornece a segurança esperada pelo consumidor, impositiva a declaração de inexistência da dívida.
(70042512681 RS , Relator: Romeu Marques Ribeiro Filho, Data de Julgamento: 22/06/2011, Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 27/06/2011)(Destaquei)


A negativação do nome junto aos cadastros de inadimplentes, sem nada dever, é suficiente para caracterizar prejuízo moral indenizável, uma vez que isso, por si só, provoca problemas na vida das pessoas. Tal situação não exige provas, por ser o denominado dano moral puro ("in re ipsa"), e configurar sofrimento injusto causado no dia-a-dia das pessoas.


Tais decisões são benéficas porque obrigam as Instituições Financeiras a desenvolver mecanismos mais sólidos de segurança que trarão mais tranquilidade tanto para as próprias Instituições quanto às demais pessoas que podem acabar sendo vítimas desse golpe, bem como podem desencorajar a prática dos fraudadores.

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